As línguas são mais do que simples meios de comunicação: elas representam identidades, histórias e modos de compreender o mundo. Quando uma língua desaparece, perde-se também uma visão única da realidade. Diante disso, a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) assumiu uma das tarefas mais desafiadoras e nobres do século XXI: proteger o patrimônio linguístico mundial e garantir que a diversidade cultural continue viva nas próximas gerações.
A diversidade linguística como patrimônio da humanidade
Atualmente, existem cerca de 7 mil idiomas falados no mundo, segundo a própria UNESCO. No entanto, mais de 40% deles estão ameaçados de extinção, especialmente entre comunidades indígenas, rurais e isoladas. Cada língua carrega um universo simbólico próprio — tradições, valores, rituais, conhecimentos ecológicos e até formas distintas de expressar sentimentos.
A missão da UNESCO é justamente valorizar essa multiplicidade, tratando as línguas como patrimônio imaterial da humanidade. Assim como se protege monumentos e obras de arte, também é necessário preservar os idiomas, que são os alicerces da memória coletiva.
Iniciativas globais da UNESCO em prol das línguas
Década Internacional das Línguas Indígenas (2022–2032)
A UNESCO lançou a Década Internacional das Línguas Indígenas com o objetivo de apoiar políticas públicas, educação bilíngue e a produção de materiais culturais em idiomas ameaçados. Essa iniciativa global incentiva os países a investirem na revitalização linguística e na inclusão das línguas indígenas nos sistemas educacionais e digitais.
Atlas das Línguas em Perigo
Uma das ferramentas mais importantes da organização é o Atlas das Línguas em Perigo, um mapa interativo que identifica os idiomas em risco no planeta. Ele fornece informações sobre o número de falantes, regiões onde são falados e o grau de ameaça. O objetivo é conscientizar governos e pesquisadores sobre a urgência da preservação linguística.
Programas de educação multicultural
A UNESCO também apoia programas de educação multilingue, especialmente em regiões onde crianças aprendem em línguas diferentes das suas maternas. Ensinar primeiro na língua local ajuda a melhorar o aprendizado e a autoestima das comunidades, promovendo inclusão e respeito às raízes culturais.
Etapas para proteger uma língua ameaçada
A UNESCO trabalha em conjunto com universidades, governos e comunidades para seguir um passo a passo estratégicode proteção linguística:
Passo 1: Identificação
O primeiro passo é mapear as línguas em risco. São coletados dados sobre número de falantes, idade média, contexto de uso e transmissão geracional.
Passo 2: Documentação
Em seguida, especialistas gravam áudios, vídeos e textos que registrem o vocabulário, a gramática, os mitos e canções tradicionais. Esse material torna-se base para dicionários e recursos educativos.
Passo 3: Revitalização
Com base nos registros, comunidades recebem apoio para criar programas de ensino, escolas bilíngues e produções culturais que estimulem o uso cotidiano da língua.
Passo 4: Digitalização e acesso global
A UNESCO também incentiva a digitalização desses conteúdos e sua disponibilização online, permitindo que o conhecimento seja compartilhado em todo o mundo. Plataformas e aplicativos desenvolvidos localmente ajudam jovens a se reconectar com sua língua ancestral.
O impacto da tecnologia e da juventude
Um dos maiores aliados da UNESCO tem sido o avanço tecnológico. A criação de teclados adaptados, tradutores automáticos e plataformas colaborativas possibilita que até línguas minoritárias ganhem espaço digital. Jovens ativistas linguísticos, muitas vezes formados em projetos apoiados pela UNESCO, estão produzindo vídeos, músicas e conteúdos em redes sociais em seus idiomas nativos.
Essas ações não apenas preservam as línguas, mas também reconstroem o orgulho identitário e conectam culturas antigas ao presente digital.
Desafios globais e responsabilidades locais
Apesar dos esforços, os desafios são enormes. A urbanização, a globalização e a predominância de idiomas como inglês, espanhol e mandarim pressionam comunidades menores a abandonar suas línguas. A UNESCO destaca que a preservação linguística não pode depender apenas de políticas internacionais: é fundamental o envolvimento das comunidades locais.
Governos devem incluir as línguas indígenas e minoritárias nas escolas, rádios comunitárias, documentos oficiais e produções culturais. Sem uso cotidiano, nenhuma língua sobrevive.
Um chamado à consciência global
Proteger o patrimônio linguístico mundial é, em última instância, proteger a alma da humanidade. Cada idioma carrega formas únicas de perceber o tempo, a natureza e as relações humanas. Quando uma língua desaparece, o mundo torna-se mais pobre em diversidade e sabedoria.
A missão da UNESCO é um lembrete de que o futuro não se constrói apenas com tecnologia e inovação, mas também com memória, identidade e respeito pelas vozes que moldaram o passado. Manter vivas essas vozes é garantir que a humanidade continue a falar — em todas as suas cores, ritmos e significados.




